sexta-feira, agosto 14, 2009

Sequência Didática de Língua Portuguesa por Maria Madalena Bechtold

HISTÓRIAS CONTADAS E CANTADAS PELO POVO

Bloco de Conteúdo: Língua Portuguesa
Conteúdo: Leitura e análise e produção de texto narrativo
Série: 4
Introdução
Por ser estabelecido que agosto é o mês do folclore e pelo fato de que os alunos desta faixa etária gostam muito de ouvir e contar histórias, optamos em trabalhar neste período com contos folclóricos do Brasil.
Abordamos esse gênero na perspectiva da análise do discurso, respeitando a variedade linguística usada em suas transcrições. Acreditamos que desse modo, preservam-se os valores históricos e culturais do texto.
O personagem principal do texto é Pedro Malasartes – reconhecido por suas artimanhas e astúcias. Pedro é um enganador inteligente e ardiloso, uma espécie de anti-herói.
No que se refere à gramática textual, trabalhamos os elementos da narrativa, sistematizando as noções de enredo, tempo, espaço, narrador e personagem, além da organização e apresentação desses elementos no texto.
Em relação à gramática normativa, priorizamos os conhecimentos sobre pontuação, em virtude de serem essenciais para o desenvolvimento e compreensão do texto ( neste caso, os específicos da narrativa), possibilitando a progressão dos fatos que compõem as histórias.

Objetivos

a) Despertar a curiosidade em relação ao conteúdo do texto, provocando a necessidade de validar suas hipóteses.
b) Determinar um objetivo para a leitura.
c) Reconhecer as características próprias de texto narrativo (narrador, ambiente, tempo, situação inicial, conflito, caracterização dos personagens, diálogo)
d) Compreender a necessidade de uso de sinais gráficos específicos em um modo de escrever o discurso direto (parágrafo, dois pontos e travessão).

Conteúdos específicos:
Elementos e estrutura da narrativa;
Sinais de pontuação.

Tempo estimado: 5 aulas de quarenta e cinco minutos.

Material necessário: textos para os alunos, quadro de giz e gravador.

Desenvolvimento das atividades
Primeira e segunda aula:
Pergunte aos alunos se já ouviram alguma história do Pedro Malasartes. Se for positivo, deixe que contem e aproveite para observar se eles usam a expressão “aí” ou “daí”para marcar a seqüência dos fatos. Caso contrário, pergunte se já ouviram falar da “Sopa de pedra”, crie um certo suspense para que fiquem curiosos e distribua o texto entre eles.

Em seguida, faça uma leitura enfatizando a entonação do discurso direto, a fim de que identifiquem a fala de cada personagem. Depois disso, seria interessante escolher um grupo de quatro leitores para fazer uma leitura dramatizada.
Finalmente, faça um breve estudo do vocabulário, analise os elementos da narrativa: narrador, personagens, tempo e espaço. Enfatize a estrutura do texto narrativo em prosa: parágrafo, a pontuação e o travessão específico nesse modo de escrever o discurso direto.

Terceira e quarta aula:
Inicie comentando que os contos populares possuem várias versões. Algumas são transcritas em forma de narrativas, como vimos no texto anterior, outras porém, aparecem em versos, como ocorre no texto a seguir, de Pedro Bandeira, que contou, de uma maneira bem original, as aventuras de nosso “herói” Pedro Malasartes. Leia o texto e confira você mesmo! Os porcos do compadre
Desta vez, seria interessante que, após a leitura pelo professor, fossem escolhidos alguns alunos para lerem as estrofes narrativas e outros para dramatizarem as falas dos personagens.
Faça atividades de estudo do vocabulário levando os alunos a pesquisarem no dicionário para que transcrevam o significado que mais se aproxima do usado no texto para as expressões regionais como:
· Aperreado
· Engambelar
· Atoleiro
· Vintém

Leve-os a compreender que os contos lidos são predominantemente narrativos, pois estão centrados em fatos e ações que se organizam em uma seqüência temporal, em séries, chamadas episódios.
· Cada episódio representa um momento diferente da história:
uma situação inicial de equilíbrio;
· o aparecimento de uma complicação (conflito ou problema), que desenvolverá a ação no sentido de buscar uma forma de resolvê-la;
· o momento de maior tensão na história, chamado de clímax;
· um desfecho, em que uma solução para os problemas é encontrada, voltando-se à situação de equilíbrio.
· A soma de todas essas partes forma o enredo do texto narrativo. (idéia central)
Feito isso, proponha as seguintes atividades:
1. Complete o quadro a seguir, identificando, nos contos lidos, cada uma das partes indicadas na primeira coluna:
Partes da narrativa:
A sopa de pedra
Os porcos do compadre
Fórmula inicial que sugere ideia de tempo indeterminado
Era uma vez...
De outra feita...
Protagonista – personagem principal da narrativa
O viajante solitário
Pedro Malasartes
Conflito-complicação ou problema que determina as ações e o desenvolvimento da história O homem quer comida, mas não conhece ninguém na cidade.
Um fazendeiro desonesto comprou alguns porcos do compadre de Malasartes e não pagou. Pedro cria uma armadilha para devolver os porcos ao compadre.
Clímax – momento de maior tensão da história
Quando os curiosos perguntam o que ele está fazendo.
O fazendeiro acha que os porcos estão enterrados e para não arrancar-lhes os rabos manda buscar dois enxadões.
Desfecho – solução boa ou má do conflito
O viajante consegue o que quer.
Malasartes, com sua esperteza enganou o caipira e sua esposa levando-lhes os porcos e o dinheiro.

2. Nos contos lidos, é o narrador que relata a fala dos personagens com as palavras dele ou ele os deixa falar livremente, representado exatamente a forma e o conteúdo da fala de cada personagem?
Retire, do texto, um trecho que justifique sua resposta:

3.a) Que sinal gráfico foi usado para indicar a fala direta dos personagens no primeiro conto?
b) E no segundo, que outro recurso foi usado? (espera-se que eles percebam que a fala dos personagens está em itálico) .
Explique que o autor optou por esse recurso porque, em uma estrutura poética, como a desse texto, o recuo de parágrafo usado normalmente não evidencia a diferença entre a fala dos personagens e a voz do narrador.

Quinta aula:
Reescreva o texto “Os porcos do compadre” em prosa organizando os parágrafos e a pontuação para indicar a fala direta dos personagens. Não há necessidade de usar rima, conte com suas palavras.

AVALIAÇÃO:
Em língua portuguesa, o texto é tanto o objeto de conhecimento quanto de avaliação. Por isso, recomenda-se que os alunos sejam avaliados por meio de textos lidos, produzidos e/ou re-estruturados.
Neste caso, o professor pode considerar uma série de atividades – individuais e coletivas - como, por exemplo, nas leituras:
· articulação das palavras e o ritmo da leitura;
· as diversas entonações das frases, de acordo com a pontuação, dando clareza à sua intenção;
No que se refere à produção escrita, observar o uso adequado dos elementos lingüísticos pertinentes ao gênero e sistematizados, tais como: uso de maiúsculas e minúsculas, paragrafação, pontuação, sequência lógica, ortografia, legibilidade e disposição gráfica.
O professor deve motivar a re-estruturação e a reescrita do texto (interferindo, inclusive, no processo, caso haja possibilidade e demanda por parte do aluno)

FONTE
http://www.portalpositivo.com.br/
A Sopa de pedras

Era uma vez um pobre homem que vivia só no mundo. Nada possuía de seu além de uma roupa feita de peles de animais, uma panela de ferro e um cajado.
Com isso andava de lugar em lugar passando, às vezes, fome além de frio, no inverno, quando não encontrava galpão ou “fogão gaúcho”aceso no qual se pudesse chegar e aquecer.
Mas o velhote era bastante esperto e contador de histórias e anedotas e, por isso, sempre se arranjava e não trabalhava.
Um dia, porém, chegou a um lugarejo em que não conhecia pessoa alguma, pois era a primeira vez que aí aparecia.
A primavera risonha enchia as roças com verduras e os jardins com flores as mais variadas e belas. Tudo era encanto, principalmente naquele humilde lugarejo, limpo e arejado.
Numa esquina, já meio-dia se aproximava, o homem parou.
Como não conhecesse ninguém, nada quis pedir para comer. Mas, a um passante pediu um fósforo e um pedacinho do “místico” da caixa.
Depois, juntou algumas pedras, bom punhado de gravetos e galhos secos. Fez fogo. Na casa defronte pediu um caneco com água. Bebeu uns goles, em seguida lavou bem duas pedras e, pondo-as na panela com o resto da água, acocorou-se ao lado do fogo. De quando em quando mexia a água com uma varinha.
Os curiosos apareceram.
— que estás fazendo? — perguntou um deles.
— A comida: minha sopa de pedras.
O espanto foi geral.
— E isto presta?
— É maravilhosa esta sopa — disse o velhote.
— Mas só pedra, sem carne, sem um osso ao menos, sem nada?
— Claro. Mas se tivesse um osso ou um pedacinho de carne, ficaria muito melhor.
Alguém lhe trouxe um osso e outro um pedacinho de carne. E lá se foram, osso e carne, para a panela.
A água já estava fervendo quando um dos curiosos lembrou-se de perguntar se umas verduras não melhorariam a sopa.
— Naturalmente, — respondeu mexendo a sopa. — Tudo quanto se puser neste caldo das pedras melhorará a sopa, inclusive uma pitada de sal.
A pouco e pouco a panela de nosso espertalhão estava cheia de verduras, batatas e muitos outros ingredientes.
Então, rindo, comeu a bom comer deixando na panela apenas as duas pedras que jogou fora, por fim, exclamando:
— As pedras deste lugar são maravilhosas! Que excelente sopa deram...
E pôs-se a caminho, alegre e satisfeito...

SPALDING, Walter. A sopa de pedra.

Os porcos do compadre

De outra feita Malasartes
Aprontou bela trapaça.
Foram os porcos do compadre
Que causaram toda a graça.

Malasartes era compadre
De um honesto sitiante,
A quem tinham enganado
De uma forma humilhante.

Certa vez um fazendeiro,
Desonesto e pão duro,
Enganou o tal compadre,
Que ficou num grande apuro.

O compadre tinha porcos,
Eram vinte ou pouco mais.
O pão-duro comprou todos,
Porém não pagou jamais.

—Malasarte, ai me acuda!
Ele nunca vai pagar!
—Fique calmo, meu compadre.
Eu sei como te vingar!

Malasartes,muito humilde,
Foi à casa do danado.
Pediu pra vender os porcos
E foi logo empregado.

Malasartes fez que foi
Para os lados do mercado.
Mas foi mesmo para a casa
Do compadre aperreado.
—Pegue logo, tudo é seu.
Vou agora preparar
Para esse fazendeiro
A lição mais exemplar.

Em seguida, no mercado,
Tratou logo de comprar
Duas dúzias de rabinhos
Pro pão-duro engambelar.

A cem metros da fazenda,
Para onde foi ligeiro,
Os rabinhos espetou
Bem certinho no atoleiro.
Correu pra fazenda, aflito:
—Oh, patrão, vem cá ligeiro!
Os seus porcos se afundaram
Bem no meio do atoleiro!

—Que desgraça, meus porquinhos?
O atoleiro é muito fundo.
Venha, Pedro, me ajudar.
Chama logo todo mundo!

—há tempo, meu patrão.
Temos de nos apressar.
Pois se a gente perder tempo,
Vão os porcos se afogar!

Bem nervoso o fazendeiro
Correu com o Pedro atrás:
—Me ajude a puxar os porcos,
vamos, força, meu rapaz!

— Meu patrão, tenha cuidado!
Sua força é demais,
Pois está arrancando os rabos
Desses pobres animais!

Pra salvar os tais porquinhos,
O patrão se esforçava:
Quanto mais força fazia,
Mais rabinhos arrancava...

— Vai pra casa, Malasartes,
bem depressa a correr!
Acho que só tem um modo
Para os porcos socorrer.
Só cavando vai dar jeito,
Se algum jeito ainda houver.
Vê se traz dois enxadões,
Peça pra minha mulher!
Malasartes foi depressa
Para a casa da fazenda
E falou para a patroa
Que havia uma encomenda,
Muito boa, com certeza,
Que acabara de chegar,
E pediu dois mil”pacotes”
Pro patrão poder pagar.

A patroa era sabida,
Bem difícil de enganar,
Estranhando aquela história,
Resolveu assim falar:
—Meu marido é controlado,
nunca deu nada a ninguém.
Você está enganado,
Não vou dar nenhum vintém!

Apontou o Mlasartes
para o lado do patrão.
Com dois dedos como um V,
E pediu explicação:

— Meu patrão, não eram dois?
Diga logo, tenha dó.
Ou será que me enganei
E vai ver que foi um só?

A pensar nos enxadões,
O caipira se enganou.
Apontou também dois dedos
E a mentira confirmou.

A mulher se convenceu
E entregou todo o dinheiro.
Malasates pôs no bolso
E sumiu dali ligeiro...

Foi bem feito pro caipira.
Quem mandou ser desonesto?
Pois ficou sem os tais porcos
E perdeu ainda o resto!

Depois de tanta aventura,
Vai ficar esta certeza:
Quem não tem força e poder
Tem de usar a esperteza...

BANDEIRAS, Pedro. Malasaventuras. Safadezas Do Malasartes.